Após várias propostas, longas discussões, avanços e recuos entre governo, entidades patronais, sindicatos e demais agentes laborais, foi publicada no início de abril a nova legislação laboral.

A Lei 13/2023 prevê dezenas de alterações ao Código do Trabalho, bem como, ao código do processo de trabalho, ao regime das contra-ordenações laborais, ao estatuto da Autoridade para as Condições do Trabalho, à lei que regula o trabalho temporário ou ao decreto-lei que rege o serviço doméstico.

De acordo com o diploma, a generalidade das alterações entra em vigor “no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação”, ou seja, a 1 de maio.

Apenas os artigos 500.º a 513.º, relacionados com a arbitragem e com a caducidade das convenções coletivas, entram em vigor mais cedo, “no dia seguinte” à publicação da lei, o que corresponde a 4 de abril. Esta antecipação está relacionada com o facto de a moratória relativa à suspensão da caducidade dos instrumentos de regulamentação coletiva ter terminado a 9 de março.

Uma das alterações de maior destaque do diploma agora publicado, incide sobre o trabalho baseado em plataformas eletrónicas, que estava pouco regulamentado na anterior legislação laboral. Assim, a nova legislação de trabalho passa a ter um artigo específico que atribui aos tribunais a responsabilidade de decidir se os estafetas ou outros agentes prestadores de serviços em plataformas digitais (Ie: TVDR) se enquadram no pleno direito de um contrato de trabalho.

Passa a estar também prevista a criminalização dos empregadores que não declarem a admissão de trabalhadores à Segurança Social nos seis meses seguintes ao início do contrato. Esta obrigação aplica-se a todas as situações – incluindo empregados do serviço doméstico – e pode originar uma condenação a pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias da entidade empregadora incumpridora.

Dada a amplitude de alterações que a nova legislação trouxe a este ordenamento jurídico, passamos a destacar apenas as mais relevantes:

  • Contratos de teletrabalho fixam valor para despesas

O contrato entre a empresa e o trabalhador deve incluir a quantia a ser paga pelas despesas adicionais do teletrabalho. Além disso, o governo estabelecerá o limite máximo até o qual essas despesas extras não serão taxadas. Essas compensações para despesas adicionais de teletrabalho serão entendidas como um custo para a empresa e não serão consideradas rendimento do trabalhador até ao limite definido pelo governo.

Posto isto, o pagamento dessas despesas extras estarão isentas de tributação, assim como o subsídio de alimentação, que tem um teto diário de 5,20 euros se for pago por transferência bancária ou de 8,32 euros se for pago com cartão de refeição.

  • Teletrabalho para trabalhadores com filhos com deficiência ou doença crónica

Nesta atualização do código do trabalho os trabalhadores com filhos que apresentem algum tipo de deficiência, doença crônica ou oncológica, independentemente da idade, agora têm o direito de trabalhar remotamente (teletrabalho), desde que seja adequado à sua função e que as empresas disponham dos recursos necessários para o desenvolvimento dessa modalidade de trabalho.

  • Direito a trabalhar em tempo parcial para cuidadores informais

Os cuidadores informais terão o direito a solicitar o regime de trabalho a tempo parcial, que consiste num período diário de trabalho igual a metade do praticado em tempo integral em situação semelhante. As pessoas que se enquadram nesta condição, poderão trabalhar nesse regime por um período máximo de quatro anos, com horário flexível e sem a obrigatoriedade de prestar horas extras.

Além disso, este novo código do trabalho prevê uma licença anual não remunerada de cinco dias consecutivos, que deve ser comunicada ao empregador com uma antecedência de dez dias, com a indicação as datas em que a licença será gozada.

  • Alargamento da licença parental do pai

A atualização do código de trabalho, passará a exigir que os pais gozem de um período de licença parental obrigatória de 28 dias, que podem ser usados de forma consecutiva ou em períodos de no mínimo sete dias nos 42 dias após o nascimento.

Destes 28 dias, sete dias devem ser usados consecutivamente logo após o nascimento. Além disso, o pai tem direito a mais sete dias de licença, desde que sejam gozados ao mesmo tempo que a licença parental inicial da mãe. Se o bebê necessitar de cuidados médicos que impliquem a hospitalização após o parto, a licença obrigatória pode ser adiada, a pedido do pai, pelo tempo do internamento.

  • Criação da licença por luto gestacional

Foi aprovada a proposta que concede um período de três dias consecutivos de luto para pais que sofrem a perda de um filho durante a fase de gestação. Tanto a mãe como o pai terão direito aos dias de luto, sem prejuízo de quaisquer direitos ou cortes salariais. Para comprovar a morte do filho durante a gestação, os pais devem apresentar à entidade patronal, uma declaração do hospital ou centro de saúde, ou um atestado médico.

  • Alargamento das licenças por falecimento

A nova legislação dilatou o período de licença por falecimento do cônjuge, filho e enteado de cinco para 20 dias consecutivos. Em relação ao falecimento de outros parentes ou afins em primeiro grau na linha reta, a licença foi estendida para até cinco dias consecutivos.

  • Valor das horas extra aumenta a partir das 100 horas anuais

O trabalho suplementar acima de 100 horas por ano será remunerado com os seguintes acréscimos: “50% para a primeira hora ou fração e 75% para cada hora ou fração subsequente em dias úteis” e “100% para cada hora ou fração em dias de descanso semanal obrigatório ou complementar, ou em feriados”. Isso representa um aumento em relação aos atuais acréscimos de 25%, 37,5% e 50%.

  • Período experimental reduzido

O novo enquadramento legal, prevê a redução ou exclusão do período experimental para jovens em busca do primeiro emprego e desempregados de longa duração, que atualmente é de 180 dias. Isto aplica-se nos casos em que o trabalhador dispõem de uma relação contratual a termo anterior de duração igual ou superior a 90 dias com um empregador diferente. Nos casos em que o período experimental dure 120 dias ou mais, a entidade empregadora deve informar o trabalhador com 30 dias de antecedência sobre a rescisão do contrato.

  • Contratos de trabalho temporários com limite de quatro renovações

O código de trabalho atualizado reduz de seis para quatro o número máximo de renovações de contratos de trabalho temporários. Isso significa que, se um contrato temporário ultrapassar esse limite, ele será convertido em um contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária.

  • Contratação coletiva trará mais benefícios para as empresas

O Estado decidiu apoiar a contratação coletiva, integrando-a nas suas políticas específicas. Dessa forma, as empresas que a pratiquem serão favorecidas no acesso a financiamento ou apoios públicos, como fundos europeus, contratação pública e incentivos fiscais.

  • Empresas proibidas de recorrer a outsourcingdurante um ano após o despedimento

As empresas agora estão limitadas a quatro renovações de contratos temporários e, caso o contrato termine por motivos não imputáveis ao trabalhador, não podem recorrer ao outsourcing para o mesmo posto ou atividade profissional antes de decorrido um terço da duração do contrato. Além disso, em casos de não renovação de contrato de trabalhadoras grávidas, trabalhadores em licença parental ou cuidadores, o empregador deve comunicar o motivo à entidade responsável pela igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, com antecedência mínima de cinco dias úteis a partir da data do aviso prévio.

  • Compensação por despedimento coletivo aumenta

Em caso de despedimento coletivo, o empregador deve comunicar por escrito essa intenção a cada um dos trabalhadores que possam ser afetados e estes passam a ter direito a uma compensação correspondente a 14 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade. O empregador é responsável pelo pagamento da totalidade da compensação, mas o trabalhador pode acionar o fundo de garantia de compensação do trabalho, nos termos previstos em legislação. Anteriormente, o código de trabalho em Portugal ditava que a compensação correspondia a 12 dias de retribuição base e diuturnidade.

  • Trabalhadores não podem renunciar a créditos (subsídios, horas suplementares e formações) no fim do contrato

Os casos de fim de contrato ou despedimento, o novo enquadramento legal entende que os trabalhadores não podem abdicar dos créditos devidos pelo empregador, tais como subsídio de férias e/ou natal, formação e horas suplementares. Essas “remissões abdicativas” terão que ser consideradas no cálculo das compensações por fim de contrato e só podem ser renunciadas através de transação judicial, ou seja, mediante acordo em tribunal.

  • SNS24 vai passar baixas até três dias

Através do serviço digital do Serviço Nacional de Saúde (SNS24), é agora possível solicitar uma baixa por doença através de uma auto-declaração sob compromisso de honra. No entanto, esta opção só é válida para situações de doença até três dias consecutivos, e limitada a duas vezes por ano.

Todo este pacote legislativo recentemente aprovado, vem promover uma maior responsabilização das entidades empregadoras e respeito pelos direitos dos trabalhadores.

Além disso, dedica especial atenção às novas relações laborais criadas pelas plataformas digitais, cria fronteiras legais que previnem a utilização por vezes deturpadora do modelo de outsourcing. A figura de cuidador informal enquanto trabalhador condicionado, encontra nesta nova legislação um reconhecimento da sua condição de limitação e sobretudo é valorizado o trabalhador e a sua família.

Já as empresas que suportam a contratação coletiva são reconhecidas por este novo quadro legal, no entanto a legislação não se atreveu a ir mais além nos apoios a empresas que promovam modelos gestão de recursos humanos inovadoras e que promovam práticas de bem-estar do trabalhador em contexto laboral.

17-04-2023

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Susana Canêdo - Advogada
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