O Assédio Moral/Mobbing define-se, em termos genéricos, pelo comportamento persecutório, no ambiente de trabalho, com vista à criação de um ambiente de trabalho hostil e degradante. Subjacente a este comportamento de assédio moral, o conceito de Mobbing é o prolongamento de uma conduta de assédio que se reflete na perseguição contínua, em comportamentos intimidatórios sobre um sujeito ou em casos extremos, pode assumir contornos de terror psicológico. Estes comportamentos ocorridos em contexto laboral, são normalmente dirigidos a pessoas com posições hierárquicas de inferioridade, posições éticas ou de outra natureza laboral opostas ao autor do assédio.
Estes comportamentos, para além do desgaste psicológico que provocam nas vítimas podem abalar a sua saúde física e, quando aplicados num contexto laboral podem afetar a performance da vítima, criando condições para o erro, suscetibilidade à resposta violenta ao agente provocador de assédio, ao desgaste relacional. As cedências da vítima a estes comportamentos de assédio laboral, normalmente desaguam na cessação do contrato de trabalho, através da rescisão do mesmo com justa causa ou, simplesmente, abandonando o seu posto de trabalho.
A conduta acima descrita caracteriza-se pelo seu carácter repetitivo, sendo este elemento essencial na qualificação do fenómeno em análise. Se não existir uma conduta prolongada de desgaste da resistência física e psíquica do trabalhador não é possível falar em Mobbing. Face ao exposto, conclui-se facilmente que o Mobbing só é apreensível pela sua visão global e não pela análise isolada dos vários comportamentos persecutórios ou, sequer, pela mera acumulação dos atos praticados.
Não obstante o Mobbing não se apresentar, como um fenómeno recente, a realidade é que a crescente competitividade entre as empresas, aliada à precarização do emprego, têm contribuído de forma decisiva para a sua crescente vulgarização. Na sua feição mais típica, a perseguição em que o Mobbing se traduz, visa contornar a proibição de despedimento sem justa causa. Alguns especialistas reagrupam as estratégias de Mobbing em cinco comportamentos básicos:
- comportamentos que recaem sobre a capacidade de comunicação da vítima (exemplo: críticas injustificadas ao desempenho do trabalhador, silêncios perante os pedidos de explicações, reclamações);
- comportamentos tendentes ao isolamento social do trabalhador no seio da empresa (exemplo: confinar o trabalhador a instalações isoladas; colocar o trabalhador num open space de costas para os demais trabalhadores ou isolado destes; dificultar o convívio com os demais colegas ou até mesmo proibir o diálogo entre estes e a vítima);
- comportamentos atentatórios da reputação pessoal e profissional do trabalhador (exemplo: difusão de rumores depreciativos ou difamatórios; colocação propositada e constante do trabalhador em situações humilhantes e vexatórias; dar ordens contraditórias; não informar o trabalhador com exatidão das suas funções);
- comportamentos que atingem o estatuto ocupacional do trabalhador (exemplo: esvaziar de tarefas; colocar o trabalhador em situação de inatividade; retirar instrumentos de trabalho; controlar excessivamente a atividade do trabalhador);
- comportamentos imediatamente lesivos da saúde físico-psíquica (exemplo: atribuir trabalhos perigosos, arriscados ou de impossível realização; assédio sexual).
O Código do Trabalho veio consignar expressamente a proibição da entidade empregadora obstar injustificadamente o trabalhador à prestação de trabalho conforme o artigo 122.º, (alínea b), do CT e igualmente de forma expressa inscreve o assédio moral como uma atitude discriminatória violadora da igualdade de tratamento no trabalho e no emprego. Assim, o artigo 24.º, epigrafado «Assédio», prescreve, no seu n.º 2, o seguinte: «considera-se assédio […] todo o comportamento indesejado […] praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objetivo ou o efeito de afetar a dignidade da pessoa ou criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador».
Neste contexto, a intenção de prejudicar o trabalhador não é um requisito imprescindível para a verificação de assédio moral. O preceito parece abrir espaço à verificação de assédio moral pelo resultado produzido, ou seja, pela verificação da “lesão da dignidade de outrem” ou a “produção de um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador”. Assim, para que se esteja perante uma situação de assédio, nos termos equacionados no artigo 24.º do CT, é necessário a verificação de “qualquer discriminação, direta ou indireta, baseada, nomeadamente, na ascendência, idade, sexo, orientação sexual, estado civil, situação familiar, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência ou doença crónica, nacionalidade, origem étnica, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical” (artigo 23.º, n.º 1 do CT). Insista-se, porém, que nem todo o tipo de assédio moral no local de trabalho é discriminação.
Ora, nos termos gerais de direito cabe ao assediado o ónus de provar os factos que integram a conduta persecutória e estabelecer o nexo de causalidade entre os danos e aquela conduta. A verdade é que na maioria dos casos a única prova possível é a prova testemunhal, sendo certo que, em regra, os demais trabalhadores da empresa não estão dispostos a testemunhar (porque foram coniventes com a situação de assédio; porque tiveram um papel ativo no mesmo, como sucede no caso do Mobbing horizontal; porque não querem testemunhar contra a respetiva entidade patronal, com medo de represálias; ou, simplesmente, porque não perceberam o real alcance dos factos integradores do Mobbing.
Esta é uma realidade infelizmente ainda presente nas organizações que afeta a não só a vivência da laboral da vítima como por vezes se estende a sua vida pessoal. Não é particularmente fácil a libertação deste ciclo de intimidação, até porque a vítima por regra apresenta-se numa posição de inferioridade hierárquica que se traduz numa certa dependência. No entanto a liberdade individual e o direito a exercer uma profissão em condições condignas são direitos fundamentais individuais e inalienáveis. Logo, a violação destes direitos basilares merece não só um repúdio moral como uma denúncia. Só esta postura de denúncia e combate a estes comportamentos “primitivos” podem prevenir a perpetuação destas condutas e criar as bases para a criação de relações laborais justas e integras.
17-05-2021