Manifestamente a pandemia contaminou a saúde económica das famílias. Os regimes de lay-off, os Lockdown impostos a negócios de risco sanitário, as quebras de rendimento dos negócios que por sua vez se estenderam às famílias são as consequências duras de uma pandemia que ainda não terminou. Lateralmente a estas dificuldades económico e sociais, começam a surgir os primeiro sinais preocupantes dos elevados indicadores de sobre-endividamento.

Estes indicadores são o reflexo das dificuldades que as famílias e os negócios estão a enfrentar e muitos infelizmente, não vão conseguir ultrapassar estes desafios financeiros. Para estes a solução a solução pode passar pelo recurso a uma declaração de insolvência.

De acordo com o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, onde também se prevê os procedimentos específicos para pessoas singulares, “é considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas”.

Isto significa, que a declaração de insolvência só deve ser solicitada quando se esgotarem todas as possibilidades de negociação, quer com os bancos quer com os credores.

O principal objetivo do processo de declaração de insolvência pessoal, que se reveste de uma respeitada complexidade (só pode ser requerido junto do tribunal requisitando os serviços de um advogado), é evitar que se permaneça infinitamente ancorado a dívidas que nunca irão ser liquidadas, possibilitando, deste modo, a reestruturação da vida financeira.

Antes de mais, importa saber que para avançar com um processo de insolvência pessoal tem de se elaborar e dirigir um pedido escrito ao tribunal da área de residência. Para dar início a este processo deve recorrer aos serviços de um advogado, uma vez que é necessária a constituição de um mandatário para a sua representação.

No âmbito do processo propriamente dito, existem duas soluções possíveis. A insolvência com plano de pagamento das dívidas aos credores ou com a exoneração do passivo restante.

Plano de pagamento das dívidas

A ideia base da insolvência consiste na elaboração de um plano que preveja uma forma de poder liquidar as dívidas aos credores. Assim sendo, após declarada a insolvência pessoal, e se ficar estabelecido um programa calendarizado de pagamentos, o tribunal elabora este plano e decide o destino de todos os seus rendimentos.

Este mecanismo é, no fundo, uma proposta de reestruturação do passivo do devedor, que pode prever um alargamento dos prazos de cumprimento, a redução das taxas de juro, o perdão de parte do capital, entre outras medidas.

Importa destacar, contudo, que o tribunal só poderá avançar com o processo mediante a sua aceitação por todos os credores.

Uma das vantagens do processo de insolvência, com plano de pagamento de dívidas, consiste em continuar a ser proprietário dos seus bens, apesar de ser declarado insolvente.

Por norma, este é o mecanismo mais indicado para quem tem um rendimento razoável proveniente do trabalho, mas não num montante suficiente para cumprir com a totalidade das suas obrigações.

Exoneração do passivo restante

No processo de insolvência pessoal com exoneração do passivo restante poderá obter, tal como o nome indica, um perdão das dívidas que não forem integralmente pagas no processo de insolvência e nos cinco anos seguintes ao seu encerramento. O pedido tem que ser feito pelo devedor no requerimento de apresentação à insolvência no tribunal.

Em termos práticos, após a declaração de insolvência pelo tribunal, é nomeado um administrador de insolvência que vai proceder à liquidação de todo o património e repartir o dinheiro que advém desta venda pelos credores identificados.

Este administrador ficará ainda responsável por gerir os rendimentos do insolvente, ficando disponível o valor definido pelo tribunal, e tendo em consideração o sustento minimamente digno do agregado familiar e o exercício da atividade profissional.

Depois disso, o tribunal profere o despacho de exoneração do passivo restante, no qual deve constar:

  • O encerramento do processo de insolvência, mesmo que ainda existam bens por liquidar;
  • O início de um período de cinco anos, durante o qual o insolvente ficará obrigado a ceder o seu rendimento a um fiduciário que irá ficar responsável por proceder ao pagamento das dívidas aos credores e dos custos do processo.

No final deste período, e se forem cumpridas todas as obrigações, o tribunal proferirá o despacho final de exoneração das dívidas que ainda existirem. Isto é, ficará totalmente liberto das dívidas da insolvência, com exceção das dívidas ao Fisco, à Segurança Social, multas, coimas e outras sanções pecuniárias devidas por crimes ou contraordenações, pensão de alimentos ou indemnizações.

A partir deste momento a situação financeira ficará livre de quaisquer restrições e poderá, inclusivamente, voltar a pedir financiamento junto de uma entidade de crédito.

Independentemente do caminho a seguir neste penoso processo, o pedido de declaração de insolvência é uma situação limite e de último recurso para se libertar de uma situação financeira penosa e sem possibilidade de reversão. Se quisermos acrescentar uma dose de otimismo, a insolvência é uma espécie de nova oportunidade para recomeçar uma vida financeira mais saudável, mas com o lastro histórico dos erros do passado como exemplo para um futuro que se pretende ser diferente.

22-07-2021

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Susana Canêdo - Advogada
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