A Exoneração do Passivo Restante é um conceito que pode não ser muito familiar à maioria dos portugueses, mas aqueles que já se submeteram ou estão num processo de insolvência, com certeza que reconhecem este regime jurídico que se aplica em casos de insolvência.

Este ano, a 11 de Abril, entrou em vigor a Lei n.º 9/2022, de 11 de Janeiro, que veio alterar, entre outros, o Código da Insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE). A entrada em vigor desta nova medida destaca-se pela redução do prazo previsto para o período da cessão de rendimentos no instituto da exoneração do passivo restante de cinco para três anos. Esta alteração, está evidenciada na alteração introduzida no n.º 2 do artigo 239.º do CIRE:

Além do destaque evidente à redução do prazo da exoneração do passivo restante, a lei introduziu novos elementos, dos quais importa salientar a que resulta da alteração introduzida ao n.º 1 do artigo 244.º do CIRE, norma que deixará de reger apenas sobre a decisão final da exoneração (cabendo ao juiz decidir sobre a concessão ou não a exoneração do passivo restante) para passar a regular também a possibilidade de prorrogação do período da cessão, nos termos do novo artigo 242.º – A do CIRE.

Assim, e sob a epígrafe “Prorrogação do período de cessão”, o n.º 1 do artigo mencionado determina que “sem prejuízo do disposto na segunda parte do n.º 3 do artigo 243.º, o juiz pode prorrogar o período de cessão, até ao máximo de três anos, antes de terminado aquele período e por uma única vez, mediante requerimento fundamentado:

  • Do devedor;
  • De algum credor da insolvência;
  • Do administrador da insolvência, se este ainda estiver em funções; ou
  • Do fiduciário que tenha sido incumbido de fiscalizar o cumprimento das obrigações do devedor, caso este tenha violado alguma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º, prejudicando por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência.”

A possibilidade de prorrogação do período de cessão não é propriamente uma novidade da nossa legislação. Esta, está expressamente prevista na Diretiva (EU) 2019/1023, de 20 de junho de 2019, sobre reestruturação e insolvência, diploma que determinou as alterações ao CIRE introduzidas pela Lei n.º 9/2022, de 11 de Janeiro.

Acontece que, ao contrário do que resulta da Diretiva, a formulação dada a este novo artigo 242.º – A do CIRE suscita algumas dúvidas de interpretação, já que a violação das obrigações que recaem sobre o Insolvente (no fundo, a desonestidade ou má-fé referidas na Diretiva), apenas é indicada como fundamento para os casos em que o pedido de prorrogação seja feito pelo fiduciário (alínea d) do n.º 1), ficando em aberto a identificação dos reais fundamentos que poderão utilizar os demais legitimados (o insolvente, um credor ou o administrador da insolvência) para requerer a prorrogação uma vez que, em relação a estes sujeitos a lei não determina o concreto fundamento que pode determinar o pedido ou o eventual deferimento, do pedido de prorrogação.

Embora, nos pareça que existam outros argumentos válidos para fundamentar o período de prorrogação, que não os previstos na lei, a verdade é que a interpretação literal do artigo não aponta nessa direção, deixando em aberto, quais os fundamentos que poderão ser utilizados e aceites, para o pedido de prorrogação.

É importante ter presente que a interpretação não pode limitar-se à letra de lei. Esta é a base na qual podem sustentarem-se interpretações alternativas válidas que possam fundamentar uma prorrogação.

Transportando esta liberdade de interpretação para o prazo da Exoneração do Passivo Restante, pode significar, na prática, a existência de prazos de cessão equivalentes aos cinco anos anteriormente previstos ou até mais longos, até um limite de seis anos.

18-07-2022

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Susana Canêdo - Advogada
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