O teletrabalho é uma realidade em acelerada solidificação nas mais diversas organizações. É certo que a pandemia foi o gatilho para o crescimento deste modelo organizacional, mas a evolução das plataformas tecnológicas foram fundamentais para este desenvolvimento exponencial. Este é o modelo de organização de trabalho mais seguro face ao contexto que atravessamos e por essa razão foi adotado pelos trabalhadores cujas suas funções são compatíveis com o teletrabalho.

A essência do teletrabalho pressupõe uma ampla flexibilidade de horários, adaptação de ritmos de vida e de trabalho e uma confiança mútua no regular cumprimento das funções e responsabilidades das partes envolvidas. Isto significa, que trabalhar remotamente não é uma condição privilegiada face a quem desenvolve a sua atividade num contexto presencial. O cenário é diferente, mas a manutenção de direitos e deveres é um argumento que deve ser garantido nesta história.

1. Propriedade dos meios usados no teletrabalho
Muitos trabalhadores estão a trabalhar a partir de casa com os seus próprios meios de trabalho, mas o Código do Trabalho é bem claro: a não ser que o contrato de trabalho assinado entre a entidade patronal e o trabalhador (porque é obrigatório existir um contrato para o teletrabalho) estipule coisa diferente, a propriedade dos meios informáticos e de comunicação usados é propriedade da entidade patronal e os custos da sua manutenção devem ser assegurados pela mesma.

Estas normas não são unicamente um benefício do trabalhador, mas também da empresa/entidade patronal. Por hipótese, podemos apresentar as questões de cibersegurança: um computador privado dos sistemas de segurança adequados podem vulnerabilizar a segurança dos sistemas de informação de uma empresa.

2. Os custos consumíveis
As despesas inerentes às tecnologias de informação e comunicação pertencem à entidade patronal, a não ser que o contrato de teletrabalho estipule coisa diferente. E pode, nomeadamente, prever uma verba mensal destinada a que o trabalhador pague as despesas inerentes ao teletrabalho. Mas se tal não acontecer, uma percentagem do custo da internet e eletricidade do local onde o trabalhador desenvolve as suas funções remotamente pertence ao empregador.

3. Subsídio de refeição
Segundo, o Código do Trabalho o subsídio de refeição não faz parte da retribuição – é um complemento dado ao trabalhador para suportar os custos de uma refeição consumida no exterior e pensada numa filosofia de trabalho presencial.
Mas há quem entenda que o trabalhador associado a um regime de teletrabalho não pode ser discriminado, até porque muitas vezes o horário não lhe permite confecionar as suas refeições, obrigando à aquisição externa.

4. A privacidade do trabalhador e o controlo da entidade patronal
Esta é uma das questões mais sensíveis. O Código do Trabalho reconhece o direito do trabalhador à sua vida familiar, ao descanso e privacidade. Na essência, o direito a um horário de igual ao dos trabalhadores presenciais.

Como tal, não são permitidas intrusões na casa do trabalhador, quer para controlo do cumprimento do horário, quer para manutenção do seu material de trabalho.

As visitas da entidade patronal apenas são autorizadas entre as 9h00 e as 19h00, com a assistência do trabalhador ou de alguém por ele designado.

Mas são manifestas as ausências de mecanismos de controlo e fiscalização. De maneira a evitar abusos de parte a parte. É imperiosa a criação de um mecanismo de registo da jornada de trabalho – até para que todo o trabalho desenvolvido para lá do horário estabelecido, seja remunerado como trabalho extraordinário. O que não está a acontecer em muitos casos.

Importa ainda referir que são completamente ilegais todos os meios intrusivos de vigilância – por exemplo câmaras, ou software de vigilância, para análise da atividade produtiva do trabalhador.

Face às lacunas e omissões legais que existem neste regime, o governo português já anunciou alterações ao Código do Trabalho, nomeadamente no regime de Teletrabalho, para acautelar várias situações abusivas.

Embora o teletrabalho, na sua essência garanta uma maior liberdade ao trabalhador na organização do seu ritmo de trabalho e horários no desenvolvimento das suas funções, isso não significa que fique isento de cumprir os seus deveres e responsabilidades perante a entidade patronal. Da mesma forma a entidade patronal deve criar condições para o normal desenvolvimento das funções dos trabalhadores que estão numa modalidade de teletrabalho, mantendo simultaneamente a privacidade dos mesmos. O cenário desta história é novo, no entanto é conservada a relação entre os intervenientes, apenas com ligeiras nuances argumentativas.

01-03-2021

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Susana Canêdo - Advogada
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