Ser advogado é como ser um malabarista de circo: temos de manter meia dúzia de bolas no ar enquanto o público: clientes, juízes ou mesmo o ministério público nos lançam tomates. As ferramentas do ofício são o nosso trapézio, as nossas redes de segurança e, por vezes, o nosso chicote para domar a fera que é um processo insolente. Vamos às imprescindíveis, com uma chávena de chá na mão e um sorriso de quem já viu de tudo.

Os códigos, esses evangelhos jurídicos, são o ponto de partida. O Código Civil, o Penal, o Fiscal, cada um é um tijolo numa muralha que separa o caos da ordem. Abrimos o Civil e lá está o artigo que nos salva da tia que quer processar o sobrinho por causa de um faqueiro herdado. O Penal é o nosso cinto de castidade moral: usamos quando o cliente jura que “foi sem querer” enquanto segura uma faca ensanguentada. São pesados, sim, mas sem eles somos uns poetas de toga a recitar versos sem rima.

O processador de texto Word, esse velho amigo é a nossa máquina de escrever com esteroides. É onde redigimos as ações que parecem tratados de paz, cheias de “excelentíssimos” e “quid pro quo” que ninguém lê até ao fim. Um erro de formatação e o juiz julga que somos uma estagiária disfarçada; um “copy paste” mal feito e estamos a pedir divórcio em vez de indemnização. É o nosso pincel, a nossa tela e, às vezes, o nosso confessionário de erros ortográficos.

O WhatsApp entrou na advocacia como um primo inconveniente que se muda lá para casa sem pedir. “Doutor, é rápido, veja esta foto do vizinho a roubar o meu limoeiro!”  e lá vamos nós, analisar provas entre emojis de beringelas e corações. É útil, sim, mas também é uma armadilha: vemos a mensagem que recebemos ás 23:00h, com a notificação de mensagem visualisada, o cliente convencido de que todos os problemas do mundo se resolvem a partir das 23:01h, continua a enviar mais mensagens. O truque é silenciar os grupos e fingir que a bateria morreu.

O Email é o correio pombo do século XXI, mas com menos penas e mais spam. Enviar um parecer ao cliente é um ato de fé: ou ele lê, ou vai direto para a pasta “coisas para o advogado resolver sozinho”. E as respostas? “Ok, doutor, mas o meu cunhado disse que é mais fácil assim” e suspiramos enquanto o servidor engole mais um anexo de 50 MB.

Webex, essa invenção pandémica, transformou audiências em reality shows. “Meritíssimo, o meu cliente está sem som porque o gato subiu para o teclado” é o novo normal. É prático, mas exige perícia: um fundo virtual mal escolhido e estamos a discutir uma tentativa homicídio com palmeiras e cocktails ao fundo. O advogado sem Webex é um dinossauro, mas com Webex mal usado, é um meme.

A Agenda digital é o nosso anjo da guarda com alarmes. Google Calendar ou Outlook, tanto faz: sem ela, esquecemo-nos da audiência das 10h e acabamos a pedir desculpas ao juiz com “o trânsito, sabe como é”. É o nosso mapa do tesouro numa selva de prazos; ignora-la é como saltar de paraquedas sem verificar se temos mochila.

O Citius, esse portal místico, é o Olimpo da burocracia digital. Carregamos documentos, consultamos processos, rezamos para que o sistema não crash quando o prazo se esgota às 23h59. É como jogar xadrez com um adversário invisível: um clique errado e o nosso requerimento vai parar ao limbo eletrónico. Sem ele, voltávamos aos papéis carimbados e às filas no tribunal, um pesadelo Kafkiano em três atos.

E, por fim, o telemóvel. Este pequeno tirano é o coração pulsante da advocacia moderna. Sem ele, o advogado era uma espécie em extinção, como um pombo-correio sem asas. Ligações, mensagens, emails, Citius na palma da mão é o nosso escritório portátil, o confessionário de clientes chorosos, o despertador para não dormirmos em cima do Código. Mas também é o nosso carrasco: desligamos e o mundo acha que morremos.

Gerir este arsenal é como cozinhar um banquete real em meia hora num fogão de campismo: precisamos de timing, engenho e um bocadinho de loucura. Os códigos fornecem-nos a lei, o Word a forma, o WhatsApp e o email o drama, o Webex o palco, a agenda o ritmo, o Citius a ponte e o telemóvel a corrente que nos prende ao circo. Bem utilizados e somos uns maestros; mal utilizados, não passamos de uns palhaços sem maquilhagem.

Porque, no fim, o advogado não vive de toga ou de eloquência vive de ferramentas que organizam o caos. E se o telemóvel pifar, rezamos para que o juiz aceite um pombo com a ação, porque sem bateria não há justiça que nos safe.

Abril 2025

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Susana Canêdo - Advogada
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