Quem nunca passou pela situação de viver num imóvel arrendado e ter de lidar com uma torneira que insiste em ser uma fonte ou com uma parede que, de tão húmida, já quase merece ser classificada como área protegida? Nestes momentos, o inquilino olha para o senhorio e o senhorio olha para o inquilino, ambos à espera de que o outro resolva o problema, enquanto a infiltração na parede se ri baixinho. Vamos então esclarecer: quem é que paga o quê?
A resposta a esta pergunta encontra-se no Código Civil Português, bem como na NRAU, em especial nos artigos 1031.º a 1064.º. Vamos por partes, como faria um canalizador eficiente.
Reparações necessárias: o senhorio como protagonista
O artigo 1031.º do Código Civil diz que cabe ao senhorio garantir que o imóvel está em condições de ser habitado. Isto inclui realizar reparações necessárias. Se o teto da cozinha começa a cair porque a vizinha de cima deixou o jacuzzi ligado durante três semanas, ou se os canos da casa resolvem fazer um protesto e param de funcionar, o senhorio é quem tem de arcar com a responsabilidade. É assim que a lei funciona, porque a vida já tem problemas suficientes para o inquilino estar a viver num imóvel que parece um campo de batalha.
Mas atenção, o inquilino também tem um papel aqui. O artigo 1038.º exige que o arrendatário avise o senhorio sobre qualquer problema. Não vale pensar: “Ah, talvez esta fenda na parede que parece a Fossa das Marianas se resolva sozinha.” Se o inquilino não avisa e o problema piora, pode ser responsabilizado pelos danos agravados. Portanto, falem, comuniquem. Um arrendamento sem comunicação é como um casamento sem diálogo: dá asneira.
Melhorias: “Senhorio faz obras. Inquilino sofre.”
Já as obras de melhoramento são outra história. Aqui, o senhorio pode decidir fazer melhorias no imóvel, desde que estas não tornem a vida do inquilino num filme de terror. O artigo 1037.º diz que o arrendatário tem de tolerar obras que sejam urgentes, mas o senhorio tem de respeitar os limites. Por exemplo, se o senhorio decide instalar painéis solares no teto da sala de estar, talvez seja melhor conversarem antes.
O ponto é este: o senhorio pode melhorar o imóvel, mas não pode piorar a vida do inquilino enquanto o faz. E, se o inquilino se sentir muito prejudicado, pode até discutir uma redução da renda durante o período das obras. Afinal, viver numa casa onde o barulho das obras é tão alto que até as plantas ficam stressadas não é propriamente o que estava no contrato.
Modificações pelo inquilino: cuidado com o DIY (Do It Yourself)
Por falar em contratos, o inquilino não pode sair por aí a fazer obras no imóvel como se fosse o irmão perdido do Tio Patinhas, dono de tudo. O artigo 1074.º do Código Civil diz que qualquer modificação significativa no imóvel requer autorização do senhorio. Portanto, demolir uma parede para criar um “conceito open space” na cozinha ou transformar a sala de estar numa pista de skate são ideias que, embora criativas, podem dar problemas.
Se o inquilino fizer obras sem autorização, o senhorio pode pedir que o imóvel volte ao estado original – e, como sabemos, demolir é fácil, mas reconstruir é outra conversa.
O segredo está no diálogo (e no contrato)
No fundo, grande parte dos problemas de obras e reparações em imóveis arrendados resolve-se com comunicação – ou, pelo menos, evita discussões mais graves. Um contrato bem feito, que deixe claro quem é responsável pelo quê, é o primeiro passo. E quando o contrato não ajuda, a lei existe para trazer algum equilíbrio.
Seja como for, senhorios, lembrem-se de que o imóvel não é apenas uma fonte de rendimento: é o lar de alguém. E inquilinos, lembrem-se de que o senhorio não é o vilão do enredo: é alguém que também tem direitos.
Se todos olharmos para o arrendamento com um pouco mais de humanidade e empatia, talvez as reparações fiquem mais fáceis de resolver – e as paredes menos propensas a chorarem de infiltrações.
09-12-2024