Portugal é um país que vive de histórias. Contamos histórias nas mesas de café, nas ruas de paralelepípedos e nas salas de estar de casas antigas. Nos últimos anos, porém, uma nova história começou a ser contada nos centros das nossas cidades: a explosão do alojamento local. De repente, Lisboa, Porto e até cidades mais pequenas como Braga ou Faro tornaram-se destinos de sonho para milhões de turistas, e os apartamentos que antes eram moradas de famílias portuguesas passaram a acolher visitantes de todo o mundo.
Mas, como em qualquer boa história, esta também tem os seus conflitos. O crescimento do alojamento local trouxe benefícios inegáveis: revitalização de zonas históricas, aumento do rendimento para proprietários e uma nova energia nas cidades. Contudo, também vieram os desafios: subida dos preços das casas, pressão sobre os moradores e uma sensação, cada vez mais evidente, de que as nossas cidades estavam a ser “emprestadas” em vez de vividas.
A atividade de alojamento local, impulsionada pela economia colaborativa e pela digitalização, tem crescido de forma exponencial nos últimos anos. No entanto, este crescimento desenfreado tem gerado alguns problemas, como a escassez de habitação, a subida dos preços dos arrendamentos e a alteração do tecido social de algumas zonas.
Para fazer face a estes desafios, o legislador português tem vindo a introduzir um conjunto de medidas que visam regular esta atividade e garantir a sua sustentabilidade.
O Decreto-Lei n.º 76/2024, de 23 de outubro de 2024, veio introduzir alterações significativas ao regime jurídico da exploração de estabelecimentos de alojamento local, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 128/2014, de 29 de agosto. Estas alterações refletem a necessidade de adaptar a legislação a uma realidade em constante mutação, marcada por um crescimento exponencial do turismo e pelos seus impactos socioeconómicos.
As principais alterações:
- Reforço dos Poderes Municipais: O diploma atribui aos municípios um papel ainda mais central na regulação do alojamento local, permitindo-lhes definir, de forma mais precisa, as áreas onde esta atividade pode ser desenvolvida e estabelecer limites quantitativos ao número de alojamentos locais.
- Criação de Áreas de Contenção e de Crescimento Sustentável: Os municípios podem agora delimitar áreas de contenção, onde o alojamento local é limitado ou proibido, e áreas de crescimento sustentável, onde esta atividade é incentivada, mas sujeita a regras mais restritivas.
- Requisitos de Habitabilidade: O diploma reforça os requisitos de habitabilidade dos alojamentos locais, visando garantir condições dignas de alojamento e evitar a degradação do parque habitacional.
- Contribuições Municipais: A possibilidade de instituir contribuições municipais sobre a atividade de alojamento local é alargada, permitindo aos municípios obter receitas para financiar medidas de mitigação dos impactos do turismo.
- Alterações ao Regime de Propriedade Horizontal: O diploma introduz novas regras para a autorização da exploração de alojamentos locais em edifícios em regime de propriedade horizontal, visando proteger os direitos dos condóminos.
Implicações para os atores envolvidos:
- Proprietários: Os proprietários que pretendam explorar o seu imóvel para alojamento local deverão verificar as regras específicas do município onde se localiza o imóvel e cumprir os requisitos legais, sob pena de incorrer em sanções.
- Investidores: Os investidores no setor do alojamento local deverão ter em conta as novas restrições e adaptar os seus projetos às exigências legais.
- Municípios: Os municípios terão de definir e implementar políticas municipais para o alojamento local, conciliando os interesses económicos com a preservação do património cultural e ambiental.
- Plataformas de Alojamento: As plataformas de alojamento online deverão adaptar os seus sistemas para garantir o cumprimento das novas regras e colaborar com as autoridades competentes.
As novas regras do alojamento local representam um desafio, mas também uma oportunidade para os proprietários que desejam explorar este mercado de forma legal e segura. Ao cumprir as novas exigências, os proprietários contribuirão para a sustentabilidade do setor e para a melhoria da qualidade de vida nas comunidades locais.
23-12-2024