A solidariedade intergeracional e a proteção social constituem alicerces fundamentais do Estado de Direito, refletindo-se na obrigação de todos os cidadãos e entidades contribuírem para a sustentabilidade da Segurança Social. Contudo, nem todos honram este dever cívico e jurídico, optando por condutas que lesam o erário público e põem em causa os princípios da justiça fiscal. Os delitos fiscais contra a Segurança Social não são meros incumprimentos administrativos, mas sim ofensas à equidade e à coesão social, suscetíveis de sanções severas.
O Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho, estabelece um quadro repressivo para estas infrações, qualificando diversas condutas como ilícitos criminais e contraordenacionais. Entre as infrações mais frequentes, destacam-se a fraude à Segurança Social e a abuso de confiança fiscal, ambas com repercussões nefastas na estabilidade do sistema previdencial.
A fraude à Segurança Social, uma ameaça à sustentabilidade do sistema
Nos termos dos artigo 103.º a 107.º do RGIT, comete fraude contra a Segurança Social quem, por meio de artifícios, dissimulações ou falsificações, obtiver indevidamente benefícios ou isenções contributivas, causando prejuízo ao sistema. Tal prática abrange desde a simulação de vínculos laborais inexistentes até à omissão de rendimentos sujeitos a contribuição. O legislador previu para esta infração uma pena de prisão até 3 anos ou multa até 360 dias, agravada se o prejuízo exceder determinado montante, podendo a pena atingir 5 anos de prisão.
Este crime atenta contra o princípio da contributividade, segundo o qual o financiamento da Segurança Social deve resultar de um esforço equitativo entre trabalhadores e empregadores. Quando alguém defrauda o sistema, transfere para a coletividade o custo da sua conduta, minando a confiança dos cidadãos na justiça fiscal.
O crime de abuso de confiança contra a Segurança Social
Não menos relevante é o crime de abuso de confiança, previsto no artigo 107.º do RGIT. Esta infração ocorre quando a entidade empregadora retém as contribuições dos trabalhadores e não as entrega à Segurança Social no prazo legal. Trata-se de uma apropriação indevida de valores que pertencem ao sistema previdencial, comprometendo a proteção social dos trabalhadores e os mecanismos de solidariedade.
De acordo com o artigo 105.º do RGIT, a pena aplicável depende do montante do valor em dívida:
- Se o montante ultrapassar 7.500 euros, o agente incorre em pena de prisão até 3 anos ou multa até 360 dias;
- Se ultrapassar 50.000 euros, a pena pode chegar a 5 anos de prisão.
Importa sublinhar que a lei prevê uma causa de exclusão da culpa se o devedor regularizar a situação antes de ser notificado para o efeito. Esta possibilidade reflete a intenção do legislador de privilegiar a reposição da legalidade em detrimento da punição pura e simples.
O impacto social e a necessidade de repressão eficiente
Os delitos fiscais contra a Segurança Social não devem ser avaliados como meros expedientes contabilísticos, mas como crimes que afetam diretamente milhares de cidadãos, comprometendo o pagamento de pensões, subsídios e apoios sociais essenciais. A impunidade destas condutas descredibiliza o sistema e penaliza aqueles que cumprem as suas obrigações.
A jurisprudência tem sido clara na sua censura a estas práticas, afirmando que a obrigação de contribuir para a Segurança Social não é um mero dever burocrático, mas sim um pilar do Estado Social. Assim, a repressão eficiente destes delitos não deve ser vista como um mero instrumento punitivo, mas como uma salvaguarda do bem comum.
O respeito pelas regras fiscais não é apenas uma questão de legalidade, mas de ética e responsabilidade social. Num Estado que se pretende justo e solidário, não pode haver espaço para a fraude e para a evasão contributiva. Afinal, quando alguém lesa a Segurança Social, não defrauda apenas o Estado, defrauda a sociedade inteira.
28-04-2025