Numa era digital em que as compras online transformaram-se numa prática comum, a frustração de receber uma encomenda que não corresponde às nossas expectativas é uma experiência infelizmente partilhada por muitos. Como advogada, e acima de tudo, como cidadã, compreendo o dissabor e a sensação de injustiça que surge quando o produto recebido difere do apresentado online. Neste texto, abordarei esta problemática à luz da legislação portuguesa, procurando esclarecer os seus direitos enquanto consumidor.

Imagine a seguinte situação: encomendou um elegante casaco azul, mas recebe um exemplar vermelho e de tamanho errado. Ou então, adquire um telemóvel com determinadas características técnicas, mas o produto entregue apresenta especificações inferiores. Estas situações, embora distintas, partilham um denominador comum: a desconformidade do bem com o contrato de compra e venda.

O Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14 de fevereiro, que transpõe a Diretiva 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2011, relativa aos direitos dos consumidores, regula os contratos celebrados à distância e fora do estabelecimento comercial, como as compras online. Este diploma legal consagra um conjunto de direitos para proteger o consumidor nestas transações.

O artigo 4.º deste diploma estabelece a obrigação de o profissional fornecer ao consumidor, antes da celebração do contrato, informações claras e compreensíveis sobre as características essenciais dos bens ou serviços, incluindo a sua descrição, qualidade, quantidade, preço e eventuais garantias. Esta informação pré-contratual é fundamental para que o consumidor tome uma decisão informada.

Quando o produto recebido não corresponde à descrição ou às características apresentadas online, estamos perante uma falta de conformidade, prevista no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, que transpõe a Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio de 1999, relativa a certos aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas.

Perante uma falta de conformidade, o consumidor tem direito, nos termos do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 67/2003, à reposição da conformidade do bem, através da reparação ou substituição do produto, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato, ou seja, à devolução do bem e ao reembolso do valor pago.

O prazo para o consumidor exercer estes direitos é de dois anos a contar da data de entrega do bem, conforme o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 67/2003. No entanto, é importante comunicar a falta de conformidade ao vendedor o mais breve possível, idealmente por escrito, guardando comprovativos da reclamação.

Além disso, o consumidor tem o direito de livre resolução do contrato no prazo de 14 dias a contar da data da receção do bem, sem necessidade de apresentar qualquer justificação, conforme o artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 24/2014. Este direito permite ao consumidor arrepender-se da compra e devolver o produto, sendo reembolsado do valor pago.

Se o vendedor não cumprir as suas obrigações, o consumidor pode recorrer aos mecanismos de resolução alternativa de litígios (RAL), como os centros de arbitragem de consumo, ou, em último caso, aos tribunais judiciais.

As compras online oferecem conveniência, mas exigem atenção aos direitos do consumidor. Perante uma encomenda que não corresponde ao que foi encomendado, saiba que a lei o protege. Informe-se, reclame e exerça os seus direitos. A sua voz é fundamental para um mercado digital mais justo e transparente.

31-03-2025

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Susana Canêdo - Advogada
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