O trabalho é, muitas vezes, um dos maiores responsáveis por muitos de nós passarmos mais tempo com os colegas do que com a nossa própria família.
Mas o que fazer quando, ao invés de ser uma história de produtividade e conquistas, o trabalho se torna uma história de dor, frustração e quem diria um acidente? Não, não estou a falar daquela “gafe” em que tropeçamos no fio do computador ou a clássica dor nas costas do escritório. Falo de um acidente de trabalho.
Breve enquadramento histórico: como chegámos aqui
O conceito de “acidente de trabalho” está longe de ser novo. De facto, remonta a meados do século XIX, quando a Revolução Industrial transformou os trabalhadores em peças da engrenagem de um sistema que muitas vezes os esmagava. Antes disso, o conceito de responsabilidade era praticamente inexistente. O trabalhador que se ferisse, fosse atropelado por uma máquina ou simplesmente fosse vítima de algum infortúnio no local de trabalho, não tinha muitos recursos para lutar pelos seus direitos.
Foi só em 1884, com a Lei de Acidentes de Trabalho na Alemanha, que começou a nascer um sistema mais organizado para proteger os trabalhadores.
Em Portugal, a legislação preventiva e promotora de condições laborais seguras é vasta e muito abrangente. A Lei n.º 102/2009 introduziu no Código de Trabalho diretrizes claras na promoção da segurança e saúde no trabalho. A recolha publicação de estatísticas oficiais de acidentes de trabalho é uma prática regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 106/2017. Por fim, no Código de Trabalho existe um particular cuidado em enquadrar uma legislação clara que estabelece as normas gerais sobre direitos e obrigações dos trabalhadores e empregadores, incluindo as relativas à proteção da segurança e saúde no trabalho.
O que deve fazer uma vítima de acidente de trabalho?
Imaginemos que, num dia normal de trabalho, o inevitável acontece. O maldito escorregão no degrau de acesso ao escritório, o dedo entalado numa porta, ou talvez aquele pequeno corte na mão enquanto tentava abrir uma caixa de cartão.
- Não se esconda (nem o acidente)
O primeiro passo é comunicar o acidente à entidade patronal. E já que estamos a falar de comunicação, nada de “só vou ali descansar e depois conto”. A comunicação deve ser imediata. Ou seja, deve-se informar o superior hierárquico ou o responsável pelo local de trabalho logo que ocorrer o acidente.
- Cuidados médicos são prioridade
Se o acidente exigir tratamento, deve ser procurada assistência médica o mais rápido possível. A responsabilidade da entidade patronal, a partir deste momento, é garantir que a vítima tem acesso aos cuidados necessários.
- Documentação, sempre
Documentar o acidente. Tirar fotografias, guardar recibos médicos, fazer um registo dos tratamentos e manter tudo organizado. Lembre-se: a memória humana, apesar de ser uma maravilha, às vezes prega partidas.
- Submissão da ocorrência à companhia de seguros
A entidade patronal deve dar conhecimento à companhia de seguros do ocorrido, para que esta possa analisar os factos e reconhecer o acidente como de trabalho e para que os direitos do trabalhador, sejam respeitados.
- Verificar se o acidente é reconhecido como acidente de trabalho
A Companhia de Seguros é a entidade que valida o acidente como sendo de trabalho. Caso não o reconheçam, a vítima deve fazer valer os seus direitos através de um processo judicial.
E a entidade patronal, o que deve fazer?
A legislação portuguesa não deixa dúvidas sobre o papel da entidade patronal. O que é que ela deve fazer?
- Garantir condições de trabalho seguras
De acordo com o Código de Trabalho, a entidade patronal tem o dever de garantir um ambiente de trabalho seguro e saudável. Isto envolve a avaliação contínua dos riscos no ambiente laboral e a implementação de medidas para reduzir ou eliminar esses riscos.
- Comunicar o acidente à companhia de seguros
Após o conhecimento do acidente a entidade patronal tem de preencher o Relatório de Acidente de Trabalho e enviá-lo à Companhia de Seguros. Se houver incapacidade temporária ou permanente, deve também garantir que a vítima tenha acesso a subsídios de acidente de trabalho. A entidade patronal também tem a responsabilidade de notificar a companhia de seguros cuja apólice de acidentes de trabalho deve obrigatoriamente estar válida
- Facilitar o acesso à reabilitação e recuperação
A entidade patronal deve garantir que o trabalhador receba o devido tratamento e reabilitação, especialmente se o acidente tiver causado lesões graves. O Código de Trabalho estabelece a obrigação de a empresa facilitar o retorno ao trabalho, sempre que possível, adaptando o ambiente ou as funções, quando necessário.
Quando a apólice de acidentes de trabalho é inexistente ou inválida
A legislação portuguesa (Código do Trabalho) exige que todos os empregadores tenham uma apólice de seguros que cubra os acidentes de trabalho dos seus colaboradores. Caso a empresa não tenha esta apólice, ela pode ser responsabilizada diretamente pelos custos associados ao acidente de trabalho.
- Indemnizações: O trabalhador poderá, em caso de acidente, reclamar indemnizações diretamente à empresa, o que pode resultar em custos elevados, uma vez que a empresa não contará com a cobertura do seguro.
- Multas e penalizações: A Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) pode aplicar coimas à entidade patronal por não ter a apólice de seguros em vigor. As multas podem ser substanciais.
O equilíbrio é o segredo
Na vida, até as melhores histórias podem ter momentos difíceis. Um acidente de trabalho é, sem dúvida, um desses momentos. Mas o que distingue as boas empresas das menos boas é a capacidade de agir de forma responsável, com empatia, sem negligência e em conformidade com a lei. Para o trabalhador, o mais importante é saber o que fazer para garantir que os seus direitos sejam respeitados e que a sua saúde seja plenamente recuperada.
08-09-2025