Imagine que está a candidatar-se a um emprego ou pretende arrendar um imóvel, entre os documentos que lhe podem solicitar, surge algo que pode causar algum desconforto: o Certificado de Registo Criminal. Um papel que, para muitos, é apenas uma simples formalidade, mas que para outros pode carregar um peso emocional e jurídico significativo.
O Certificado de Registo Criminal é mais do que uma folha de papel com informações sobre o passado judicial de uma pessoa. Ele reflete a tensão entre dois valores essenciais na nossa sociedade: por um lado, a segurança e a proteção de terceiros; por outro, a oportunidade de reintegração e o respeito pela privacidade. Vamos explorar este tema, analisando o que a legislação portuguesa nos diz e como esta questão afeta a vida de tantos cidadãos.
O que é o Certificado de Registo Criminal e para que serve?
De acordo com o artigo 7.º da Lei n.º 37/2015, que regula o sistema de registo criminal em Portugal, este certificado é um documento emitido pela Direção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ) e contém informações sobre as condenações transitadas em julgado de uma pessoa. Estas informações incluem crimes cometidos, penas aplicadas e outras decisões judiciais, mas apenas aquelas que, por força da lei, ainda estejam registadas.
O objetivo do registo criminal é claro: proteger a sociedade, garantindo que certas informações sobre a conduta de uma pessoa sejam conhecidas em contextos específicos, como a contratação para empregos sensíveis (trabalhar com menores ou em segurança privada, por exemplo). Contudo, o certificado também respeita limites importantes, refletindo o princípio constitucional do direito à reintegração social.
Quem pode pedir e consultar o registo criminal?
Este não é um documento que qualquer pessoa possa obter sobre outra. O artigo 8.º da Lei n.º 37/2015 determina que o certificado só pode ser pedido:
- Pelo próprio titular do registo;
- Por terceiros, mas apenas com o consentimento expresso do titular;
- Por entidades públicas ou privadas, mas apenas quando tal seja exigido por lei para o cumprimento de deveres específicos (por exemplo, instituições de ensino, empresas de segurança, entre outras).
Ou seja, se lhe solicitarem um certificado de registo criminal no contexto de uma candidatura a emprego, esta solicitação tem de estar fundamentada na necessidade de verificar que o candidato cumpre os requisitos legais para exercer a função.
A questão do tempo: o que aparece no registo criminal?
Muitas vezes, quem passou por um processo judicial ou foi condenado por algum crime pergunta: “Até quando isto aparecerá no meu registo criminal?” A resposta está no artigo 11.º da Lei n.º 37/2015, que regula os prazos de cancelamento do registo criminal. Estes prazos variam de acordo com a natureza do crime, a pena aplicada e o cumprimento das condições determinadas pelo tribunal.
Por exemplo:
- No caso de penas de prisão inferiores a 5 anos, os dados podem ser removidos ao fim de 5 anos, desde que o condenado não cometa novos crimes durante esse período.
- Já para penas superiores ou reincidência, os prazos podem estender-se por décadas.
Esta limitação temporal reflete o princípio de que todos têm o direito de recomeçar e de que a reintegração é essencial para evitar a perpetuação de um ciclo de potencial exclusão social.
O equilíbrio entre proteção e reintegração
O pedido de um certificado de registo criminal deve ser sempre ponderado e proporcional. Por exemplo, a legislação portuguesa protege determinados grupos, como os jovens, garantindo que medidas educativas aplicadas a menores (como no âmbito da Lei Tutelar Educativa) não constem no registo criminal quando atingem a maioridade. Esta regra reflete a crença de que erros de juventude não devem marcar para sempre o futuro de um indivíduo.
Ao mesmo tempo, há áreas em que a sociedade não pode correr riscos. É por isso que o artigo 2.º da Lei n.º 113/2009 exige a apresentação do registo criminal para todas as pessoas que pretendam trabalhar com menores, garantindo que aqueles que têm histórico de crimes graves (como abusos sexuais) não tenham acesso a posições de risco.
Humanizar o registo criminal: uma visão além do papel
Por detrás do Certificado de Registo Criminal estão histórias de vida. Erros que foram cometidos, penas que foram cumpridas, e, muitas vezes, um desejo genuíno de recomeçar. Como advogados, é nosso papel recordar que a lei não deve apenas punir; ela também deve reabilitar e oferecer segundas oportunidades.
06-01-2025